Thursday, June 29, 2006



©AnaPereira2006
Imagens da Série ‘UMA PARTE’

Tenho vergonha de mostrar o meu corpo na intimidade. Abrir o corpo, as pernas, o peito.
Mostrar o corpo a outra pessoa, na intimidade, significa mostrar o caminho da minha fragilidade.
Mostrar o meu corpo fotografado não tem o mesmo significado.
Um corpo fotografado é um outro corpo, uma outra pessoa, uma outra entidade.
Nunca fui sensível às imagens de corpos nus, parecem-me quase sempre um pretexto.
Já fotografei pessoas por pretexto, para as conhecer melhor, homens e mulheres.
Fotografar partes, partes pequenas de corpos, corpos que conheço, daqueles a quem conheço o cheiro.
Não procuro imagens abstractas, mas aquelas que vemos quando estamos deitados com alguém, as partes que vemos quando estamos suficientemente perto, suficientemente calmos para pensar noutra coisa qualquer.
Quando o Leonel me falou desta intervenção sobre igualdade pensei nesta série, que tanto me fála de semelhança como de diferença.
E que fála essencialmente de partilha.

Obrigada: Maria João, Magui, Mafalda, Lino, Geo, Inês, Pedro C, Gabi, Nelson, Pedro M, Salomé e Sónia


Iniciativa Espaço T
Estaçao Metro da Trindade
Inauguração dia 1 de Julho, 17h

Monday, June 26, 2006

Un film mai fatto

Os aeroportos não têm espaço.
Só tempo.
Ficam ali ou acolá, mas lá dentro perco a noção de estar em algum lugar, familiar.
No ‘Mistery Train’ o rapaz japonês que era fã do Elvis dizia que só fotografava os aeroportos e os hóteis, porque eram as únicas coisas de que invariavelmente se esquecia.
Já comi aquela estranha comida miniaturizada.
Estou por cima de água, muita água.
Os mapas que passam nos pequenos monitores dizem que é o mediterrâneo.
Os italianos, pela amostra dentro do avião, fálam mais do que os portugueses e são mais confiantes.
Não sei se é a palavra que aumenta a confiança ou a confiança que aumenta o discurso.


Coloseo, posto de venda. Setembro 2003

Não esperava nada de Roma.
Esperava que tudo o que eu quisesse ver ou mesmo o que eu não soubesse, ficasse no mesmo sítio, aquele local, redondo e imaginário chamado Centro.


Forum romano. Setembro 2003

Sinto-me desconfortável na minha pele.
Vejo o meu reflexo nos olhos dos outros.
Às vezes quero ver, às vezes não me interessa e outras vezes só sinto que existo por esse reflexo.
Bebo café todos os dias no mesmo sítio, compro o jornal no mesmo quiosque.
O céu aqui em Roma é bonito.
O azul muito azul, as nuvens muito cinzentas e muito brancas.

Os rapazes de Roma
Gosto dos louritos, dos muito morenos e dos orientais.
Gostam de mim e eu deles, invariavelmente, os mais lourinhos e os muito morenos com ar de maus.


Rapaz na Fontana di Trevi. Setembro 2003

O silêncio tem um peso absoluto.
A música e a tv ajudam-me a acreditar que está tudo bem na minha vida.
No silêncio é que percebo que não.
No silêncio não entendo o que faço aqui dentro de casa sózinha.
No silêncio não entendo que fotógrafa sou eu, sem trabalho nem projectos.
No silêncio não entendo o que faço aqui.
Preciso de tempo.
E de uma televisão foda-se!

Não sei porque tenho tanto medo.


Auto retrato na casa de banho. Outubro 2003

O medo quase que me impede de viver.
Impede-me de viver melhor pelo menos.
E é um medo infantil.
Da noite, do escuro, do que não conheço.
O álcool …


Salada de tomate. Casa da Angela. Outubro 2003

Qual o campo da fotografia?
Aquele que é só dela, que tem a pintura como base e que depois se afasta?

Fotografei a Pietá.
Fiz uma imagem da IMAGEM.

O tempo que o Hockney define como a grande falha e a grande qualidade da fotografia.
O tempo do disparo que escapa ao controle do fotógrafo, o momento do acaso.


Museus do Vaticano. Setembro 2003

Os fotógrafos dos jornais são iguais em todo o lado.
Aqui a diferença é o capacete que trazem no pulso esquerdo.

Hoje tenho as unhas pintadas e as roupas brancas.
A máquina não lava nada e a minha roupa branca está a ficar cinzenta.
As mulheres em Roma.
Tem sempre o cabelo penteado, a pele da cara bela e hidratada.
Usam sempre base e muito lápis preto nos olhos, especialmente as morenas e batom.
Fazem sobressair as mamas e o rabo, já de si generosos.

Esta rua é mesmo boa.
Alguém toca piano.
Começo a gostar de estar aqui.
Hoje quando acordei pensei na minha vida lá.
Odeio acordar com aquele sabor a ontem na boca, sabor à decomposição dos cigarros e do álcool.


Auto retrato depois de tirar o verniz. Outubro 2003

Roma e os pitbull.
Os carabinieri armados até aos dentes em estado de alerta aparente.
A pizza de um só ingrediente.
A praça de Espanha, com as lojas caras, cheia de japoneses loucos agarrados aos sacos.
Os turistas mal educados.
A capela Sistina. Michelangelo.
A paz da Basílica de S.Pietro.
A bela Pietá de olhos baixos atrás de uma vitrine, bombardeada de flashes.
Os cornetos que afinal se vai a ver e são croissants.


Manhã na Via Brennero. Gato e jeep. Outubro 2003

A Roma dos gatos, bem tratados e semi selvagens.
No dia em que fui ver a fraca exposição do Michelangelo no Pallazio Venezia, à saída no átrio, um grande e belo gato saltava para as almofadas vermelhas dos bancos de pedra e deitado olhava para o dia a passar.
Da comida que não acaba.
Das motas.
Das raparigas de pochete e salto alto e os rapazes de fato a cruzarem a cidade nas suas motas.


Auto retrato na casa de banho da Angela. Outubro 2003

Do desejo, nas ruas, no metro, no museu, no restaurante.
Das mulheres roliças, de peitos e coxas generosas e olhos brilhantíssimos.
Dos homens mais belos que já vi, ao vivo e a cores, tantos no mesmo espaço geograficamente delimitado.
E eu só gosto mesmo dos que têm cara de maus.
Em Roma envelhece-se bem.

Já estou cansada de Roma.
Já não quero ser estrangeira.
Ser estranha aos sítios, aos hábitos, às comidas, bebidas e língua.
Não me apetece estranhar a falta de preocupação que as pessoas parecem ter por essa entidade peculiar chamada O OUTRO.
De latina só tenho o cabelo. Ou serão as sobrancelhas?

Penso em Antuérpia.Faz-me falta a serenidade.


A ler a revista. Setembro 2003

Gosto dos jornais, com as suas belas e completas revistas.

Do caffelatte em todos os sitios.


Pantheon. Setembro 2003

Do amor aos gatos.


Notte bianca. Projecção do filme “La Dolce Vita” na Fontanna di Trevi.Outubro 2003

Da cidade que é muito bela.

Pôr do sol, no nosso quarto, na casa da Angela. Outubro 2003

Mas hoje não gosto de mais nada e em particular, não gosto das pessoas.


Publicidade da Fendi com retrovisor de moto na Via del Corso. Setembro 2003


©AnaPereira2003

Monday, June 19, 2006

A tela de uma historia que nao se acende










Fotografia ©Ana Pereira2006

A propósito do trabalho do Teatro Bruto Alter-Ego, a Luena propôs-me procurar e fotografar os cinemas do Porto, alguns dos quais actualmente encerrados ou com actividades paralelas à exibição de filmes e procurar as imagens, os fantasmas, as memórias e particularidades de cada sala.
O primeiro cinema a que fomos foi o Charlot.
Dentro do e perdido no centro comercial Brasília.
Abertas as portas e acessas as luzes a vida volta a encher o espaço desta sala, como aquelas cenas dos filmes em que se acende a luz do parque de festas e lentamente começa a ouvir-se o som dos carrosséis e das pessoas ao fundo.
Em todo o lado, por todos estes cinemas, assim que as luzes se acendem a vida volta, não existem marcas da ausência das pessoas, conseguem-se sentir os cheiros e ver as marcas de parte das histórias que se viveram, nas imagens, nos recados, nas fotografias, em todas as provas de memória.
Sempre que me sentava numa das cadeiras a olhar para a tela, quase que conseguia sentir as pessoas a chegar para a próxima sessão.
Como se estes momentos em que estou a fotografar fossem apenas pequenos intervalos de tempo, entre sessões, entre filmes, entre histórias.
Agora falta acabar o site para o trabalho e encontrar o espaço certo e o dinheiro para expor as imagens.
Sempre tanto por fazer.
Junho 2006

Tuesday, June 13, 2006

Sobressaltos






Fotografia AnaPereira

Assédio
1-22 junho
estudio zero
21h30

Monday, June 12, 2006




















Lobo Diogo e Mosquito Valentim
Casa da Musica/Orquestra do Porto/Marionetas do Porto
Maio/Junho 2006
Fotografia AnaPereira

www.fotolog/net.diariopurpura

Sunday, June 11, 2006

Thursday, June 08, 2006

Wednesday, June 07, 2006

O projecto da Alice



Para o Espaço T pensei primeiro no trabalho das garbage Story’s, refazê-lo no espaço, com o lixo que ainda houvesse e construir várias camadas de imagens, sobrepostas.
Não sei como fui parar à Alice. Acho que quando vi o espaço, o quarto, pensei que finalmente tinha a possibilidade de construir o quarto da Alice.
Fotografia quer dizer a escrita da luz.
Uma aparente e real barreira de dificuldade em transcrever, tornar visiveis para quem não vê as imagens, estas e outras, quaisquer outras.
Procurei e encontrei processos de transposição, alto-relevo em papel e outros materiais.
Encontrei um fotógrafo cego, mas que trabalha no campo do visível.
Encontrei referência a uma exposição de um fotógrafo português em alto relevo, mas não consegui encontrar imagens.
Como veem as imagens, aqueles que não veem?
Depois da primeira conversa no Espaço T com o Joaquim, percebi que a exposição teria de ser fisica, mais do que imagens na parede, dai talvez ter pensado no quarto da Alice.
Numa conversa ao fim da tarde disse-me ‘ tocar e sentir é o nosso ver’.
Tenho andado de volta das imagens da Alice, do quarto, dos sons, de como posso transformar uma sombra preta numa pele branca numa outra sensação para além da visual, aliás, como posso provocar com outro sentido aquele estímulo que me provoca olhar para uma sombra preta numa pele branca, ao lado de um fio de cabelo?
Tenho pensado também que a fotografia também poderá muito bem não ser a forma de expressão mais adequada para este fim e ponto final.
E de repente penso em pequenos grupos e em como a grande parte dos trabalhos se esgotam rapidamente, a partir do momento em que saiem daquele pequeno grupo…
O que quero dizer com este trabalho, porque o fiz eu afinal?
Afinal Alice, Ana, ou quem quer que seja a rapariga?
Fiz este conjunto de imagens numa fase claustrofóbica da minha vida.
Vivia com o meu namorado, não tinha trabalho, não estudava, não tinha dinheiro, vivia um dia a seguir ao outro, sem grande vontade nem desejo.
Comecei a fotografar-me nessa casa, que ao mesmo tempo que me provocava conforto me aprisionava e da qual não tinha vontade de sair.
Nua porque era verao, porque estava sozinha, por causa do desejo, porque provavelmente procurava uma imagem de mim que me reconfortasse, que me fizesse gostar de olhar para mim, gostar de mim, que me fizesse acreditar que apesar de não me sentir feliz, nem realizada nem útil nem nada, me fizesse de alguma forma acreditar em mim.
E tudo isto tem sentido para mais alguém?
Este mundo pós-supra- ou lá o que seja-moderno, blogueiro, internético-digital aguenta mais destas auto-confissões representadas de mulheres e homens que às vezes ainda se chamam de jovens?
Que não sabem o que fazer com a vida que tem e que se queixam o tempo inteiro da puta da sorte, mesmo que tenham de facto uma vida facilitada?
Precisava de fechar este trabalho, de acabar esta história, esta Alice.
As minhas fotografias, histórias são uma parte dos meus fantasmas e preciso de os recriar e mostrar para eles partirem.
Eu uso a fotografia para me tentar resolver, compreender.
Não sei se é ético, correcto, mas também não quero saber.
Só sei que o tenho de fazer.
Para os visitants cegos, passei as fotografias para desenho que depois passámos a alto relevo.
Depois de testes no Instituto S Manuel, percebemos que o melhor era haver também uma legenda descritiva em Braille de cada imagem.
Dentro do quarto existem sons, sons de uma casa, de mim nessa casa, feita de várias casas.
Mas na exposição o som está muito baixo e é abafado pelos sons dos outros quartos.
Existe uma cama e um sofá, porque preciso de estar parada, deitada, preciso de ler, escrever, ouvir, chegar a conclusões e faço-o muito melhor sentada e deitada.
Na inauguração odiei estar no Espaço, não gostei da relação entre as pessoas, ouvi comentários horriveis, não gostei da grande parte dos projectos, senti que tudo era um bocadinho farsa, inclusivé o meu trabalho, que de repente deixou de fazer qualquer sentido.

Um agradecimento ao Instituto S.Manuel (Ana Pinto/Santos/Teresa/Cecilia) e ao workshop intensivo que me deram sobre cegueira, Braille e alto relevo.
E porque nem todas as histórias mesmo que tenham de ser vividas não tem de ter um final feliz.

Sunday, June 04, 2006

Afinal Alice, nao havia nada do outro lado









O quarto da Alice no Espaço T, manifestaçao colectiva, rua do vilar, até ao fim do mes de Junho