Monday, June 26, 2006

Un film mai fatto

Os aeroportos não têm espaço.
Só tempo.
Ficam ali ou acolá, mas lá dentro perco a noção de estar em algum lugar, familiar.
No ‘Mistery Train’ o rapaz japonês que era fã do Elvis dizia que só fotografava os aeroportos e os hóteis, porque eram as únicas coisas de que invariavelmente se esquecia.
Já comi aquela estranha comida miniaturizada.
Estou por cima de água, muita água.
Os mapas que passam nos pequenos monitores dizem que é o mediterrâneo.
Os italianos, pela amostra dentro do avião, fálam mais do que os portugueses e são mais confiantes.
Não sei se é a palavra que aumenta a confiança ou a confiança que aumenta o discurso.


Coloseo, posto de venda. Setembro 2003

Não esperava nada de Roma.
Esperava que tudo o que eu quisesse ver ou mesmo o que eu não soubesse, ficasse no mesmo sítio, aquele local, redondo e imaginário chamado Centro.


Forum romano. Setembro 2003

Sinto-me desconfortável na minha pele.
Vejo o meu reflexo nos olhos dos outros.
Às vezes quero ver, às vezes não me interessa e outras vezes só sinto que existo por esse reflexo.
Bebo café todos os dias no mesmo sítio, compro o jornal no mesmo quiosque.
O céu aqui em Roma é bonito.
O azul muito azul, as nuvens muito cinzentas e muito brancas.

Os rapazes de Roma
Gosto dos louritos, dos muito morenos e dos orientais.
Gostam de mim e eu deles, invariavelmente, os mais lourinhos e os muito morenos com ar de maus.


Rapaz na Fontana di Trevi. Setembro 2003

O silêncio tem um peso absoluto.
A música e a tv ajudam-me a acreditar que está tudo bem na minha vida.
No silêncio é que percebo que não.
No silêncio não entendo o que faço aqui dentro de casa sózinha.
No silêncio não entendo que fotógrafa sou eu, sem trabalho nem projectos.
No silêncio não entendo o que faço aqui.
Preciso de tempo.
E de uma televisão foda-se!

Não sei porque tenho tanto medo.


Auto retrato na casa de banho. Outubro 2003

O medo quase que me impede de viver.
Impede-me de viver melhor pelo menos.
E é um medo infantil.
Da noite, do escuro, do que não conheço.
O álcool …


Salada de tomate. Casa da Angela. Outubro 2003

Qual o campo da fotografia?
Aquele que é só dela, que tem a pintura como base e que depois se afasta?

Fotografei a Pietá.
Fiz uma imagem da IMAGEM.

O tempo que o Hockney define como a grande falha e a grande qualidade da fotografia.
O tempo do disparo que escapa ao controle do fotógrafo, o momento do acaso.


Museus do Vaticano. Setembro 2003

Os fotógrafos dos jornais são iguais em todo o lado.
Aqui a diferença é o capacete que trazem no pulso esquerdo.

Hoje tenho as unhas pintadas e as roupas brancas.
A máquina não lava nada e a minha roupa branca está a ficar cinzenta.
As mulheres em Roma.
Tem sempre o cabelo penteado, a pele da cara bela e hidratada.
Usam sempre base e muito lápis preto nos olhos, especialmente as morenas e batom.
Fazem sobressair as mamas e o rabo, já de si generosos.

Esta rua é mesmo boa.
Alguém toca piano.
Começo a gostar de estar aqui.
Hoje quando acordei pensei na minha vida lá.
Odeio acordar com aquele sabor a ontem na boca, sabor à decomposição dos cigarros e do álcool.


Auto retrato depois de tirar o verniz. Outubro 2003

Roma e os pitbull.
Os carabinieri armados até aos dentes em estado de alerta aparente.
A pizza de um só ingrediente.
A praça de Espanha, com as lojas caras, cheia de japoneses loucos agarrados aos sacos.
Os turistas mal educados.
A capela Sistina. Michelangelo.
A paz da Basílica de S.Pietro.
A bela Pietá de olhos baixos atrás de uma vitrine, bombardeada de flashes.
Os cornetos que afinal se vai a ver e são croissants.


Manhã na Via Brennero. Gato e jeep. Outubro 2003

A Roma dos gatos, bem tratados e semi selvagens.
No dia em que fui ver a fraca exposição do Michelangelo no Pallazio Venezia, à saída no átrio, um grande e belo gato saltava para as almofadas vermelhas dos bancos de pedra e deitado olhava para o dia a passar.
Da comida que não acaba.
Das motas.
Das raparigas de pochete e salto alto e os rapazes de fato a cruzarem a cidade nas suas motas.


Auto retrato na casa de banho da Angela. Outubro 2003

Do desejo, nas ruas, no metro, no museu, no restaurante.
Das mulheres roliças, de peitos e coxas generosas e olhos brilhantíssimos.
Dos homens mais belos que já vi, ao vivo e a cores, tantos no mesmo espaço geograficamente delimitado.
E eu só gosto mesmo dos que têm cara de maus.
Em Roma envelhece-se bem.

Já estou cansada de Roma.
Já não quero ser estrangeira.
Ser estranha aos sítios, aos hábitos, às comidas, bebidas e língua.
Não me apetece estranhar a falta de preocupação que as pessoas parecem ter por essa entidade peculiar chamada O OUTRO.
De latina só tenho o cabelo. Ou serão as sobrancelhas?

Penso em Antuérpia.Faz-me falta a serenidade.


A ler a revista. Setembro 2003

Gosto dos jornais, com as suas belas e completas revistas.

Do caffelatte em todos os sitios.


Pantheon. Setembro 2003

Do amor aos gatos.


Notte bianca. Projecção do filme “La Dolce Vita” na Fontanna di Trevi.Outubro 2003

Da cidade que é muito bela.

Pôr do sol, no nosso quarto, na casa da Angela. Outubro 2003

Mas hoje não gosto de mais nada e em particular, não gosto das pessoas.


Publicidade da Fendi com retrovisor de moto na Via del Corso. Setembro 2003


©AnaPereira2003

5 Comments:

Anonymous Anonymous said...

MAstrubei-me a ver a tua maminha.É linda!

9:32 AM  
Anonymous Anonymous said...

és msm mastRunço ó "MAstrubei-me"...
excelente post ana, adorei.

12:58 PM  
Blogger subtilezas said...

que bonito registo anita, as palavras e as imagens. eu adorei itália, das 2 vezes que lá fui. criei verdadeiras relações carnais com as cidades. há uma canção do caetano que é "sampa" que ele fala da sua relação com são paulo.
inspiraste me para colocar no blog essa musiquinha. beijos_anita_linda_como_é_itália:)

2:30 AM  
Anonymous Anonymous said...

Gosto muito d'este librinho da Roma, obrigadinho. Beijos.

5:46 AM  
Anonymous Anonymous said...

Great site lots of usefull infomation here.
»

2:23 PM  

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